* CANDELABROS EM GUADALAJARA & outras inquitações
O
UNIVERSO DO APRENDIZ (o site original)
© Roi James, Woman with Eastern Bluebird, 2005.
CANDELABROS EM GUADALAJARA
Parte I
Observemos as aves sobre os campos de feno.
Não
pousam nas pedras vermelhas e negras,
pairam,
glissam, serpenteiam pelo ar.
Não
se sabe se são sempre as mesmas ou outras.
Olho-as
como se fossem as últimas
e
talvez sejam...
Entrego-lhes
a espera
porque
têm um ar tão paciente
e
não partem nunca.
Hoje, por exemplo,
é
um dia vulgar.
A
vida corre pelos seus rios
calmamente
ou
então é indiferentemente
e
é por isso que as nossas confissões dormem
serenamente
sob
obeliscos negros de ónix
e
nos sentimos felizes por nada revelarem os nossos rostos.
Deixamos
descair o chapéu sobre os olhos
e
trauteamos enigmas ao azul límpido deste instante.
Ouvem-se
menos ruídos nas encruzilhadas
e
as luzes não parecem todas faróis gigantes,
candelabros
intensamente fluorescentes
ou
outras fontes de ludíbrio.
Uma
pessoa deita-se de costas na cama
E
não fica à espera de nada.
A
filosofia pousa-nos nas pálpebras
ou
sobre um jarro de flores
sob
a forma de uma borboleta moribunda;
Damos-lhe
um sopro e volta a voar
e
quando erguemos um pouco a cabeça
e
a vemos afastar-se pela janela,
sentimo-nos
tranquilos com a sua inextinguível fragilidade.
É assim que acontece muitas vezes o imprevisto,
um
subtil longo dedo do destino
e
outras experiências e descobertas…
Quantos
deuses se ergueram das neblinas
e
fantasmas se incrustaram nos cérebros
e
asas foram tecidas para a borboleta que há-de vir
em
momentos como este…
A ociosidade é um bem essencial,
contudo
poucos têm o talento que ela exige:
um
espírito incansável e um grande amor ao trabalho.
A
mãe dos dinossauros e dos cisnes de cristal
exige
grandes provas de fidelidade aos seus filhos
e
amantes amados.
Há
momentos em que tudo parece possível
e
nada convence as galáxias perdidas nas teias desta humanidade finita
da
quase inutilidade
da
sua beleza e complexidade.
Eu,
por mim, não me convenço de nada
senão
da primeira e última vez de cada instante;
faço
apenas as minhas tranças de estrelas,
convictamente
como sempre.
A borboleta voltou;
está
pousada no parapeito.
Olho
lá para fora;
todas
as aves pousaram nas pedras vermelhas e negras,
excepto
uma... mas é azul e branca
e
há instantes em que os meus olhos a fundem com o horizonte.
Desta janela avista-se demasiado,
avista-se
o mundo inteiro
(e
nem sempre tenho a certeza de que isso seja bom;
às
vezes olhar por uma janela é pensar o mundo inteiro de uma só vez):
Demasiados
cilindros aplanando as montanhas
Demasiados
interiores de casa-ecrã
Demasiado
carnaval
Demasiadas
lojas de fantasias
Demasiados
desfiles comemorando a nostalgia
Demasiadas
gotas de sangue nas lâminas dos leques de marfim
Demasiados
príncipes e princesas de línguas bífidas
Demasiados
duelos entre gnomos e gigantes
Entre
máscaras e gotas de água límpida
Entre
segundos de êxtase e séculos de espera
Entre
um vestido de cetim e um vestido de crepe
Entre
os templos caídos e os templos erguidos
Entre
o fogo e a Fénix
Entre
a Fénix e os caçadores de fénixes
Entre
os verdes campos e o extenso teatro
Entre
o deserto e a flor
Demasiadas
alucinações sem retorno
Demasiados
labirintos que desembocam em fábricas e casinos de terapia
Demasiados
monstros de muitas cabeças e um vazio coração
Demasiadas
multidões domesticadas, hirtas, exangues
Demasiados
adeptos do modelo único de felicidade
Demasiadas
imitações do amor
Demasiada
angústia que os corpos não podem enganar
Demasiada
dor que os corpos não podem extinguir
(mas
os olhos escondem como pedras preciosas)
Demasiada
lucidez
Demasiadas
faces da transparência
Demasiadas
suspeitas…
E,
no entanto, a laje tépida da eira onde as aves pousaram agora,
—
a mesma onde me deitei em noites de azul profundo
para
contar um milhão de estrelas
e
descobrir feliz a minha insignificância,
pela
milionésima vez —
continua
tranquila e tépida, qual leito comum da humanidade.
Talvez nunca devesse ter construído a minha janela
numa
colina tão alta,
donde
os meus olhos são atraídos para todos os abismos,
por
onde a minha alma esvoaça, por vezes, sem aviso
e
me deixa sozinha com a minha finitude humana.
Contudo,
não é apenas medo ou raiva que sinto
quando
ao mesmo tempo avisto
soldados
caídos à sombra do chefe guerreiro
e
os paraísos perdidos reerguerem-se nas praias
nas
noites em que o luar fica a sós com o mar
— quem
sabe, talvez continuem intactos
nalgum
livro sagrado
nalguma
gruta marinha
ou
gravados em algum tronco de árvore colossal e antiquíssima
que
os homens ainda não encontraram.
Isto
que vejo, isto que sinto,
isto
que sou quando vejo e sinto
é
cada ser e toda a humanidade de uma só vez.
É
excessivo olhar por esta janela.
É
impossível fechá-la.
É
impossível negar o mundo.
Só
é possível fechar os olhos,
mas
o microscópio telescópico continua lá
(invisível,
debruça-se do parapeito da janela)
com
as lentes alojadas no fundo das minhas íris.
Agora, é noite
as
aves dormem sob as estrelas
e
as vozes de todos os tempos emergem mais nítidas
da
brisa que agita a folhagem
e
esmorece na maciez reconfortante do feno.
Será
mesmo noite?
As
cores do céu trazem em si os dias de outros tempos,
de
outros seres que viveram esta mesma noite
ao
longo de infinitos dias…
Suy
/ São Ludovino, 11/7/1986
© Roger M. Richards, An old man sits at a
destroyed bus stop in a city
where buses no longer run, Sarajevo, Bosnia and Herzegovina, February 1993.
Circle
of Life by ©Selina De Maeyer – Model: Pauline Grossen - Deviantart.
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